Vida

A era do imediatismo

Algumas semanas atrás fiquei 3 dias sem wifi na minha casa e quase tive uma crise de ansiedade. Não porque estava afim de atualizar minhas redes sociais a cada cinco minutos e saber o que estava acontecendo na vida de famoso tal, mas sim, porque eu dependo da internet para trabalhar. Na verdade depender é uma expressão muito forte, vamos dizer que, sem conexão, meu trabalho torna-se extremamente limitado.

Passar esses dias trabalhando em um coworking e usando a 4g que ainda restava do meu plano de celular, me fez refletir sobre algo extremamente óbvio, mas que por ser tão presente no nosso dia a dia, nós nos esquecemos: somos totalmente dependentes da tecnologia – de uma forma ou de outra.

Por mais que de vez em quando a gente faça um detox das redes sociais, tente se policiar com relação a desbloquear o celular no automático ou escolha ir pessoalmente ao banco e pagar as contas direto no caixa, não tem como fugir – já vivemos em uma época onde se tornou inviável demais fazer de conta que a tecnologia não existe e que não podemos usá-lá a nosso favor. Não precisamos ficar desconectados para chegar a essa conclusão.

No último ano, quando nos vimos em situações de solidão e lockdown, onde precisávamos nos organizar o máximo possível para não sair de casa, pudemos perceber o quanto a tecnologia facilitou diversas atividades do nosso dia a dia e aliviou a saudade que sentíamos uns dos outros.

Durante a minha reflexão, percebi o como nos tornamos imediatistas de uns tempos pra cá. Hoje é tudo tão simples e rápido (e eu realmente acredito que seja só o começo) que as coisas não são mais pro final da tarde ou pra amanhã. Elas são pra esse exato momento.

A gente começou a ter muita pressa pra fazer tudo. E essa pressa causa ansiedade. E ficar ansioso não é nada bom.

Parece que esperar uma hora se tornou uma eternidade, que não conseguir acessar um site em poucos segundos se transformou em um gatilho gerador de stress e que temos obrigação de zerar nossa caixa de entrada e responder as mensagens que recebemos quase que imediatamente.

Ficamos chateadíssimos se o delivery que tinha previsão de chegar as 19:30 atrasa e chega as 20 horas, se nossa encomenda que chegaria na sexta chega na segunda, se o aplicativo do nosso banco que geralmente é super rápido não está funcionando direito, e como assim não consigo atualizar o feed do instagram agora ???

Todos os dias, as boas empresas de tecnologia, estão extremamente focadas em entregar produtos e serviços com qualidade de ponta. Isso quer dizer que, milhares de equipes estão trabalhando para que a logística das entregas seja mais rápida e mais eficiente do que já é, para que os aplicativos e sites continuem performando bem diante uma quantidade gigantesca de acessos simultâneos e que as transações bancárias sejam cada vez mais intuitivas e imediatas.

Hoje nós prezamos por agilidade porque sabemos que tempo é um recurso extremamente limitado. Não da pra ficar desperdiçando ele com atividades que, se forem executadas utilizando a tecnologia como uma aliada, podem nos poupar alguns valiosos minutos.

Só que, ao mesmo tempo que a tecnologia corre contra o relógio para entregar o melhor que pode, nossa vida não segue o mesmo ritmo. E é isso que me preocupa.

Ficamos tão acostumados com tudo ao nosso redor acontecendo tão rápido e praticamente pra ontem, que cheguei à conclusão que às vezes queremos que os acontecimentos na nossa vida acompanhem o mesmo passo.

Queremos plantar hoje e colher amanhã. Estudar agora e saber tudo na próxima hora. Tentar uma primeira vez e querer que saia perfeito.

Andamos ansiosos e imediatistas com progressos que levam meses, muitas vezes anos para acontecer.

Instituições como a The Atlantic e a Royal Society for Public Health tem inúmeros artigos publicados sobre o impacto que as redes sociais causam na nossa saúde mental. Nunca na história, nos comparamos tanto com as outras pessoas como fazemos nos dias de hoje.

Acompanhar a vida perfeita (e muitas vezes manipulada) de pessoas que nem conhecemos, faz com que acreditemos fielmente, que existe algo de errado com a nossa própria vida. Quando na verdade, não é bem assim que as coisas funcionam.

Pois eu queria te falar a mesma coisa que falo pra mim toda vez que começo a achar que a minha vida não está como deveria.

As coisas levam tempo, e como tempo, entenda: tempo de verdade.

Algumas delas levam muito tempo.

Idealizar um objetivo hoje e querer que ele se concretize amanhã, é pressa, é imediatismo, e é um pouco de ingenuidade.

Aproveitar integralmente cada micro etapa do nosso caminho, entender que a vida dos outros não é um mar de rosas e que não da pra apressar as coisas, clicando em botões mágicos que passam para a próxima tela como fazemos nos aplicativos dos nossos smartphones 24 horas por dia, tornou-se crucial para manter minimamente nossa saúde mental.

Viver acreditando que a vida vai progredir tão rápido, é negar as curvas sinuosas que precisamos enfrentar todos os dias.  É negar a existência de problemas e é acreditar que somos extremamente felizes o tempo todo. E quando negamos isso, roubamos de nós mesmos uma etapa extremamente importante para nosso crescimento pessoal: a real motivação para seguirmos em frente é a contínua busca pela solução desses problemas e por consequência, por uma vida melhor.

O foco do texto de hoje não foram as redes sociais (ainda quero falar muito sobre esse assunto por aqui!), mas pesquisas reais comprovam como ela está ligada aos sintomas de depressão e àquela sensação de que a nossa vida não sai do lugar, quando a dos outros vai muito bem. Se você tiver interesse, indico a leitura do artigo Have Smartphones Destroyed a Generation ? do The AtlanticVocê pode acessar seu conteúdo de forma gratuita, clicando no título dele ou aqui.

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