Uma meia carta aberta sobre ir embora da casa dos pais
Fui embora da casa dos meus pais aos 22 anos. Naquele momento eu era recém graduada e estava caçando (literalmente) uma oportunidade de trabalho na minha área de formação. Na minha cabeça se passavam diariamente uma tonelada de pensamentos que envolviam o seguinte tema: “a minha vida não sai do lugar”.
Foram incontáveis os currículos enviados para as mais diversas indústrias e também incontáveis as respostas que nunca apareceram. Eu não tinha passado na prova do mestrado – que, no fundo, eu não queria fazer, mas, se tivesse sido aprovada provavelmente teria feito, e, além disso, era a única dos meus amigos que nunca tinha saído da casa dos pais, muitos fizeram faculdade fora ou já tinham saído para trabalhar em outras cidades.
Foi por conta dessa sensação de não “andar para frente e nem para trás” que quando apareceu uma oportunidade para trabalhar em outra cidade, aceitei sem ter dúvidas – sem medir os prós e os contras.
Hoje, sendo muito realista, se eu soubesse de verdade quanto dinheiro eu precisava ganhar para ter uma vida minimamente confortável, e entendesse o básico sobre descontos da folha de pagamento, eu não teria ido.
Não só falando sobre dinheiro mas também sobre responsabilidades: quando moramos com a nossa família, temos uma ideia muito limitada sobre o que significa morar sozinho. Muitas vezes acreditamos que sabemos tudo, quando, na verdade, não sabemos é nada.
Ter um lugar para chamar de seu e ditar suas próprias regras, não ter o irmão mais novo pentelhando na sua volta e não dar satisfação aos pais de onde, com quem, e que horas volta é o sonho e objetivo de vida de muitos jovens.
Porém, a teoria, na prática, é outra.
Nos perguntamos como as coisas ficaram tão caras da noite pro dia, começamos a caçar promoções e fazer contas e mais contas no supermercado para definir o produto com melhor custo benefício.
As atividades domésticas ficam por dias naquele estado de procrastinação e avaliamos se realmente não vale a pena comer um pão com ovo em vez de cozinhar para uma pessoa só e criar uma pilha infinita de louça para lavar e organizar depois.
Falando em comida, nossa geladeira parece viver só daquela garrafa de água gelada e dos incontáveis potes com restinhos de comida.. E por conta da falta de dinheiro, do comodismo ou de ambos, transformamos itens provisórios em definitivos.
Nos enganamos muito pensando que a solidão não vai bater. Ficar sozinho, é muito difícil. Mesmo com a correria do dia a dia, parece que mais cedo ou mais tarde a ficha cai e percebemos a falta que sentimos de estar na presença daqueles que amamos.
Quando vamos embora começam os perrengues, dos simples aos mais inimagináveis possíveis, a saudade se torna imensurável e o arrependimento bate por não termos valorizado da forma correta ou prestado atenção quando nossos pais quiseram nos ensinar algumas coisas extremamente valiosas.
Aquele começo de vida sozinha foi difícil. Eu não sabia quanto dinheiro ia ter depois da infinita lista de descontos do regime CLT e muito menos quanto ia gastar por mês. Não sabia trabalhar 8 horas, ou mais, por dia e lidar com a administração de uma casa e muito menos com a administração da vida simultaneamente.
Eu falo que eu não teria ido porque toda essa carga se somou ao meu descontentamento profissional – eu não me identificava com o que estava fazendo e tinha uma jornada extremamente exaustiva no trabalho. Tudo isso virou uma gigantesca bola de neve que parecia só aumentar um pouquinho mais a cada dia.
Apesar da singularidade das nossas histórias, uma coisa é certa, sair da casa dos pais é um passo gigantesco no nosso crescimento pessoal.
Sério, parece que em pouquíssimo tempo nós nos tornamos pessoas completamente diferentes. Caso você não saiba o que é viver minimamente com disciplina, morar sozinho – uma hora ou outra – acaba ensinando, praticamente na marra, o significado dessa e de outras palavras extremamente básicas.
Mudar de profissão e me tornar nômade, minimalista e fazer incontáveis outras coisas, com certeza foi fruto da minha saída da casa dos meus pais, pela busca de uma vida mais independente.