Carreira

O que nos contam sobre o mercado de trabalho quando estamos na faculdade.

Era Fevereiro de 2013, mas lembro-me desse momento com tanta clareza que poderia ter acontecido ontem. Eu estava em segundo lugar da lista de espera do vestibular de Engenharia de Alimentos e não tinha muita certeza se conseguiria a vaga. Querendo ou não esse resultado definiria meu futuro pelos próximos anos, então, pensamentos como “será que eu estudei o suficiente?”, “e se eu não passar, o que vou fazer da vida?” ocupavam minha cabeça diariamente.

No dia da matrícula, quando chamaram meu nome, apresentei a documentação, assinei muitos papéis e a vaga era minha. Parecia que eu tinha ido parar no céu.

Se você já viveu a angústia de aguardar a aprovação de um concurso, entende o que eu quero dizer — naquele momento, sentia que todos os meus problemas estavam resolvidos. Encontrava-me na condição de caloura de um curso que eu queria fazer, em uma universidade pública, o qual o campus ficava a poucas quadras da minha casa onde eu vivia com a minha família, o que era excelente, pois não teríamos despesas extras com moradia em outra cidade ou a mensalidade de um curso particular – e sendo bem sincera, a possibilidade de um curso particular nem existia.

Nos primeiros anos da faculdade, não fazemos ideia de onde estarão as oportunidades, como deveríamos montar os nossos currículos, que pessoas concorreriam conosco (além-claro, os colegas da própria profissão), quais eram as faixas salariais reais e o que os profissionais graduados poderiam fazer, até onde poderíamos chegar.

Eu tive aulas de química orgânica (em dobro porque repeti a disciplina), aprendi a fazer cálculos monstruosos, decorei de trás pra frente, conceitos ensinados pelos professores nas disciplinas de bioquímica dos alimentos, garantia e controle de qualidade, e sabia tudo – ou melhor, estudava muito pra saber o máximo possível de matérias específicas de tecnologia como, lacticínios, frutas, bebidas, carnes, entre inúmeras outras.

Formatei trabalhos e mais trabalhos seguindo as normas da ABNT, e aprendi a determinar a quantidade de proteínas em alimentos, utilizando o método de Kjeldahl.

Enquanto éramos sobrecarregados de disciplinas que ocupavam boa parte dos nossos dias, pouco, ou melhor dizendo, nada se falava sobre o depois.

Aprendemos muito sobre coisas mais complexas, mas não sabíamos nada sobre os conceitos de processo seletivo, estágio e mercado de trabalho.

Parece que passamos esse período tão, focados em ir às aulas, entregar trabalhos e passar nas matérias, que não nos damos por conta que sabemos pouquíssimo sobre o que fazer depois que isso tudo acabar.

Agora, racionalmente falando: como é que podemos passar tanto tempo sem pensar no que vai acontecer depois?  Ou melhor, sem saber informações extremamente simples sobre a nossa profissão? Convenhamos, é importante saber onde estamos nos metendo, e quando eu falo do saber, é o saber de verdade – sem meias palavras ou romantizações.

Conforme o tempo vai passando, nos enturmamos e fazemos amizades com os veteranos do nosso e de demais cursos, observamos que existem algumas dificuldades no meio do caminho que vão além das preocupações já existentes.

Pra quem faz uma faculdade de período integral e não pode atuar no mercado de trabalho durante a graduação, por conta de alguns intervalos entre uma aula e outra serem o único tempo livre, aqueles anos são uma realidade paralela com o mundo lá fora.

Algum tempo atrás, em conversa com meu namorado, falávamos sobre o seguinte ponto: nós entramos na faculdade pensando que nossa vida está ganha, que vamos conseguir um estágio na área em que mais nos identificamos, que logo sairemos empregados recebendo pelo menos a remuneração de piso salarial – porque seria o coerente, considerando que estudamos para isso – e depois, é só sucesso.

A pouca informação que temos sobre o que acontece depois da colação de grau, geralmente, vem da experiência que poucos amigos que já estão no mercado de trabalho dividem conosco.

Posso contar nos dedos às vezes que escutei em sala de aula sobre o mercado de trabalho não ir bem, que os profissionais estavam cada vez mais sendo pouco reconhecidos e que os recém-formados estavam com muita dificuldade para encontrar emprego.

Sinceramente, o mercado está para lá de saturado. Já passou da hora da realidade do depois ser discutida abertamente entre professores, acadêmicos e os profissionais que vivem suas diferentes realidades, para que, se reinventar na profissão, pensar em um plano alternativo, adquirir habilidades e competências que sejam realmente consideradas um diferencial, esteja à rápido alcance dos jovens que se formam ano após ano. De forma que a compreensão do mercado de trabalho, não seja tardia e tão desgastante.

É muito melhor formar pessoas que conhecem minimamente as regras do jogo e sabem o que está acontecendo, ao formar pessoas que não estão preparadas para enfrentar certos caminhos, que não entendem determinadas dinâmicas e que provavelmente em pouco tempo estarão descontentes e desmotivadas com suas formações e trabalhos – infeliz realidade de muitos profissionais que não sabem o que fazer com os seus diplomas.

2 comentários

  • Victor Fantazzini

    Gostei muito deste texto, relato bem verdadeiro, penso que a maior parte dos cursos das universidades não preparam o aluno para o mundo real, e coisas básicas realmente são deixadas de lado. Outro pensamento que vem a mente, após 11 anos trabalhando em uma mesma empresa é de que cada vez mais quem permanece e/ou segue o jogo do mundo corporativo sai privilegiado, muitas pessoas deixam de ser quem são para se manterem dentro das organizações que muitas vezes não querem somente o nosso serviço, mas tambem moldar nossas crenças e valores…. Keep the good work 🙏🏼

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